Ela gostava de
se vestir com as roupas dele. Jurava que no espelho poderia imitá-lo.
Escondida, durante a noite, ia pé ante pé até o banheiro, abria a porta que
tinha a maçaneta redonda e grande. Empurrava o pino e lá ficava escondida,
brincando. Às vezes tinha medo das coisas que poderia encontrar.
Uma vez
encontrou uma caixinha, muito pequena mesmo, essas de colocar anel, mas não
teve coragem de abri-la.
Ela se vestia
com a blusa que ele deixava pendurada no gancho atrás da porta. Enchia o
pequeno rosto com aquela espuma de barbear que mais parecia um chantilly, o
mesmo chantilly que sonhava ter no seu bolo de aniversário. Mas eles nunca
comemoravam nenhuma festa. Olhava-se agora com toda aquela espuma e ficava
adivinhando ele no espelho. Imitava-o no gesto do barbear, criando caminhos com
o próprio dedo no meio de toda aquela espuma e, do mesmo jeito que ele fazia,
mastigava a língua pra fora da boca. Ah, isso era o que ela mais gostava.
Ele não! Ele
gostava de poucas coisas. Bem poucas. Ela acreditava que as coisas que ele mais
gostava cabiam numa bolsa apenas. A Capanga, como ele chamava.
Um dia, ela
arriscou-se a olhar o que realmente havia lá.